Combinamos de nos encontrar na casa da Lu  e fazer uma reunião muito íntima, entre amigas que são muito diferentes entre si, mas que nutrem muito carinho, respeito e admiração mútua.

Tão logo soubemos que nossa amiga estava curada, mas iria rolar uma quimioterapia básica e a queda de cabelos seria um dos efeitos colaterais mais visíveis, a Lets logo se prontificou a raspar a cabeça no mesmo dia que a Lu e eu fui na aba,  junto com a Gabi que registrou esse momento pra gente lembrar pra sempre. Assim formamos uma trupe delirante.

Já fiquei sem cabelo muitas vezes ao longo da vida e faço uso desse recurso sempre que preciso zerar a quilometragem, me sentir liberta, fortalecida e renascida. Foi assim quando casei. De novo quanto virei mãe e por aí vai. Recomendo fortemente e claro, torcendo que não seja por motivo de doença ou efeito colateral, que ninguém é bobo de dourar a pílula.

Mas hoje eu quero contar como foi aquele dia e o que aconteceu depois dele.

A ideia era mesmo passar a máquina nos cabelos da Lúcia, para que ela pudesse se acostumar com a queda antes do coice. Sim, esta é uma expressão dura, mas a realidade pode ser ainda mais, se não encaramos os percalços com bom humor e leveza. E eu pessoalmente, acredito que a sensação de perda (do cabelo ou do que for) é coisa que se puder ser amenizada, melhor pra todo mundo. E assim a tarde seguiu, entre ideias, risos e extrema cumplicidade.

Ficar sem cabelo não é nada perante tudo, o pacote completo da mudança que essa doença promove. Depois de algumas conversas, a Lu, com pouquíssima resistência, se entregou aos nossos cuidados. Já não tinha mais por onde escapar. Corajosa demais essa moça!

Comecei o serviço com uma tesoura de cozinha, pois era a que tínhamos em mãos. Logo depois dona Letícia e sua expertise capilar entraram em campo com tesourinha afiada e maquininha em punho e oficializou o propósito, num profissionalismo tamanho que se não fosse cozinheira, podia ser cabelereira fácil.

Coube-me dar um up na maquiagem, quando a coisa começou a esquentar, poses e fotografias, cicatrizes expostas no corpo desnudo e uma euforia danada tomando conta da gente, numa corrente de amor que circundava aquele momento, que nem consigo descrever, mas as imagens aqui e ali traduzem muito bem: Pura magia.

Quando nos demos por satisfeitas, chegou o momento da Lu se olhar pela primeira vez no espelho depois do furdunço e vislumbrar-se descabelada. E só ela pode contar o que sentiu, mas eu fiquei emocionadíssima em ver ali uma mulher cheia de esperança e vida nova.

Cabelo cresce.

Logo depois chegou a minha vez e confiei o serviço a Letícia, que  passou a máquina apenas nas laterais, pois venho ostentando, faz alguns meses, um moicano bem ridículo, que chamo de corte calopsita, com alguns fios bem longos que contam um outra história bem minha. Eles também irão embora, deixando outra dor pra trás, mas por hora, decidi preservá-los para o meu próximo momento redentor.

A Letícia, toda destemida, cortou meu moicano novamente e Gabi não perdeu nenhum momento, sempre com um olhar delicado e amoroso, auxiliada por ser marido Andrew e sua filha Rebeca, que acompanharam nossa aventura do começo ao fim.

E o que mais posso dizer sobre esse dia?! Que com aquele monte de cabelo espalhado por mim e pelo chão eu vi a vida e o amor acontecer. Que cada fio daquele que foi pro lixo, levou consigo o que não presta, o que não serve, o que não cabe mais em ninguém. Que ter amigos de fé é a melhor coisa que podemos querer por perto, em todos os momentos e principalmente nos mais significativos e transformadores.

Ali, naquela tarde, renasci junto com a Lu. E o melhor de tudo foi renovar minha fé no amor e na amizade. Perceber que unidas somos fortes, somos mais, seja como e onde for. Só posso agradecer pela honra de fazer parte disso junto esse povo tão luxuoso. Sou uma descabelada com orgulho. E sei que de um jeito ou de outro, ainda vou me descabelar muito por aí. Por isso, sigo, fio a fio, em frente.

Denize Barros@lareinamadre

 

14 respostas

  1. Como não ficar estarrecida diante dessas fotos? Como não ficar com os olhos marejados diante dessas palavras? Como não perceber a diferença, a sutil e estrondosa diferença entre vencer uma batalha com amor e perdê-la por medo? Como não pensar que é o amor e amizade que promove mudanças e torna tudo tão mais leve?!

    Ainda com aquele nó na garganta e pensando: “que lição de vida é essa?”

    Sou fotógrafa, e estou me sentindo orgulhosa, enaltecida, um tanto mais humana e feliz, por ver uma colega mostrar de forma tão brilhante a beleza que habitou em cada fio que caiu. Me sinto orgulhosa, de verdade, porque a fotografia eternizou a bravura e suavidade de uma fase que passou, como tantas fases que a gente enfrenta, e as vezes sem tanta coragem e alegria.

    Um salve a cada uma de vocês envolvidas nessa empreitada, que mude a vida de muitas e muitas pessoas, como certamente já mudou a minha.

    Tirar da memória a lembrança triste de amigos e familiares que já passaram por isso e ter na tela mental pra sempre essa risada descabelada, é sem dúvida um presente.

    Um beijo,
    Rafaela.

    1. Rafaela, muito obrigada por seu comentário tão inspirado. O nosso objetivo é exatamente esse que você “captou”. Eu, hoje, estou fazendo a mesma pergunta que você: Que lição de vida é essa?! A gente se descabela por tão pouco não é mesmo?! Pois pronto. É isso. Que bom que você gostou do “presente”. A culpa é toda da Lu.

    2. Rafa!!! Obrigada pelo carinho, pelas palavras!!! Só sei que fotografar com emoção… com amor FAZ DIFERENÇA! Estar envolvida no momento, com as pessoas, SER ali e não apenas ESTAR, faz toda a diferença, o resultado é outro, é palpável! E sim… a ‘culpa’ como disse Denize é da Lu <3

  2. Profundamente emocionada com a história da Lu e a atitude das amigas. Só o amor salva mesmo, e a amizade é uma das mais fortes e puras faces do amor. Minha admiração por você só cresce, Denize, que gesto lindo. Eu não conheço as outras envolvidas nesse abraço amoroso e descabelado, mas diz pra todo mundo que eu mandei meu beijo, minha força, meu carinho, respeito e os maiores desejos de que, junto com os cabelos novos, nasça vida em todo seu esplendor e abundância pra Lu e pra todas vocês que a acompanharam nessa jornada.
    beijos,
    Ana Paula

  3. Dê, chorei com o seu depoimento. quanta delicadeza, ternura e amor.. você é realmente incrível! Beijocas

  4. De,

    Sua missão era uma das mais difíceis do dia. Trazer à tona a beleza de nossa queridíssima Lu durante um processo muito visceral. Ela ficou um Diva, “cheia de esperança e vida nova” como você bem colocou. Ela continua louca, mas aí são outros quinhentos hahahhahaha

    1. Drew, fizemos um belo trabalho em equipe hein?! Os muitos “dia de rainha” que fiz no meu atelier, me mostraram que todo mundo tem uma porção de beleza pra vida louca pra achar a saída e basta um jeitinho, uma palavrinha besta, um “queixo pra cima faz cara de rica” e pimba, a boniteza escapa e sai. ;o) Obrigada por estar junto querido, sua “luz” foi fundamental.

    1. Amanda, obrigada pelo carinho. A gente se acostuma a falar das coisas ruins, das pequenas reclamações do cotidiano e esquece de mostrar as demonstrações de amor e carinho sincero. Por isso fizemos isso, pra lembrar sempre, em cada recado deixado aqui, que é melhor seguir o caminho da fé que vai dar certo de mãos dadas com quem a gente quer bem. Não é assim?! Um beijo pra você.

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